Encontramos hoje todos os tipos de informações, artigos, teses, experimentos, pesquisas sobre a maternidade e a educação dos filhos. O arsenal é grande e geralmente se concentra em métodos, técnicas, estilos, nos quais podemos confirmar com teorias de especialistas o que quisermos. Atestamos assim os nossos produtos de uma construção da maternidade que pode ser tanto baseada nas afirmações e crenças recebidas quanto nas nossas defesas e dificuldades para fazermos o que fazemos. E, assim, lembrando Guimarães Rosa: “Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães...”

Raras vezes, no entanto, paramos para tomar uma distância de nós mesmas e buscamos uma observação genuína para reconhecer a nossa verdade como mães. Uma das dificuldades de fazermos isso é que a verdade que cada uma carrega da maternidade real coloca todos os ideais à prova. Tendentes a atestar com explicações e metodologias sem antes refletir o suficiente sobre a grande provocação que recebemos ao sermos mães, entramos em um circuito somente de avaliação e julgamento daquilo que concordamos ou rejeitamos, os quais se baseiam geralmente em uma construção utópica, banalizada e mistificada da maternidade. Contudo, assim que nos tornarmos mães, temos a oportunidade de adentrarmos em um terreno lamacento, que proporciona encontros com nossas faces mais feias, iradas, manipuladoras, exigentes, carentes, inseguras e infantis, mas que muitas das vezes não queremos nem nos aproximar. E, a fim de evitar tal encontro, recorremos a justificativas ou padrões idealizados de como devemos agir, sempre com uma crença de que fazemos o que fazemos pelo bem dos nossos rebentos, sem a consciência de que esse “bem” faz a todos muito mal.


As contradições que carregamos não possuem muito espaço para se manifestar, sequer na nossa intimidade e, com isso corremos o risco de não integrar à nossa personalidade como mães aquele lado escuro que os nossos filhos irão certamente apontar na juventude deles...

Para aproximarmos dessa face é preciso coragem e apoio para enfrentá-la. Em um mundo que valoriza somente um lado das coisas e se opõe sem complementar aquilo que lhe é contrário, torna-se muito difícil fazer essa empreitada sozinhas e, portanto, realmente ajuda se tivermos alguém para apoiar, confrontar e ampliar, valorizando tanto o doce quanto o amargo da maternidade. Assim  como tudo na vida, a maternidade também abriga a ambivalência e se conseguirmos integrar as duas faces ao mesmo tempo, poderemos fazer emergir uma flor única, que de todo o lodo e escuridão que se encontra, faz brotar uma maternidade singular, realmente baseada nos próprios sistemas de valores. Podemos apropriar da nossa maternidade, de fazermos o que fazemos devido ao sentido que nos tem, sem precisar nos sentir tão intimidadas quando vamos contra a corrente em voga do momento que sempre garante: “é assim que se faz”. Com isso, crescemos, deixamos de ficar tão cambaleantes diante dos desafios que a maternidade traz e auxiliamos também o passo mais firme que os nossos filhos terão de dar para buscar compreender e atuar nesse mundo. A autoridade de mães que protegem, mas também promovem o desenvolvimento e o caminhar rumo ao próprio destino que os nossos filhos exercitarão sozinhos pode então ser continuamente exercida e renovada de acordo com cada momento que vivemos, sem tantas máscaras, faz-de-conta, enrijecimentos ou racionalizações. Mães que erram, que acertam, que voltam atrás, que pedem desculpas, que fazem de novo, que corrigem sem medo, que choram, que gritam, se descontrolam, se arrependem e sempre recomeçam, dando crédito para o contínuo descobrir de si, do outro e da vida...